“São as ong autênticos negócios disfarçados de obras de caridade?”

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No dia 15 de Abril de 2016, os programas Sexta às 9 (RTP1) e Sexta às 11 (RTP3) lançaram esta questão: “São as ONG autênticos negócios disfarçados de obras de caridade?” Não tendo sido, no entender da Fundação Gonçalo da Silveira e de muitas das restantes Associadas da Plataforma Portuguesa das ONGD (PONGD), cabal e rigorosamente respondida esta questão, a Direcção da PONGD apresentou uma Declaração onde explora este tema e o contributo das ONGD para um mundo mais justo e equitativo.

Dada a pertinência e importância deste assunto, transcrevemos de seguida a comunicação da Plataforma Portuguesa das ONGD, na qual amplamente nos revemos:

 

CONCEITO DE ONG

ONG é um conceito vago no qual cabe todo o tipo de organizações privadas. Não corresponde a esta designação qualquer natureza jurídica ou estatuto legal.

Para todos os tipos de organização que cabem nesta designação, existe uma natureza jurídica distinta e um estatuto legal distinto que definem as respectivas regras (direitos e deveres) a que estão sujeitas.

Assim, colocar no mesmo universo conceptual (critério adoptado pelas referidas reportagens) estas organizações com estruturas orgânicas, com modos de funcionamento, direitos e deveres, sistemas de fiscalização, transparência e responsabilização tão distintos, ainda que tenham objectos sociais semelhantes, leva a generalizações preconceituosas e injustas para cada uma das categorias de organização.

 

AS ORGANIZAÇÕES NÃO GOVERNAMENTAIS PARA O DESENVOLVIMENTO (ONGD)

As ONGD portuguesas podem ter distintas naturezas jurídicas reguladas pelo Código Civil. Além desta natureza jurídica, se tiverem como objecto social os domínios da Cooperação para o Desenvolvimento, da Ajuda Humanitária e de Emergência e/ou da Educação para o Desenvolvimento podem solicitar ao Camões – Instituto da Cooperação e da Língua (por poderes delegados do Ministério dos Negócios), nos termos da Lei n.º 66/98 de 14 de Outubro, o reconhecimento do estatuto de ONG de Desenvolvimento.

 

FISCALIZAÇÃO PÚBLICA DA ONGD ENQUANTO INSTITUIÇÃO

Este estatuto é atribuído depois de uma análise à organização e ao ser concedido é-o apenas por 2 anos. Para a renovação a organização é reavaliada. Ao solicitarem e enquanto têm o estatuto de ONGD, os Ministérios dos Negócios Estrangeiros e das Finanças, bem como os demais ministérios no âmbito da respetiva competência sectorial, poderão ordenar a realização de inquéritos, sindicâncias e inspeções às ONGD (artigo 16.º da referida Lei).

 

OS BENEFÍCIOS QUE DECORREM DO ESTATUTO DE ONGD

A atribuição deste estatuto, segundo a referida Lei, confere alguns direitos, alguns dos quais não têm qualquer aplicação prática pois os direitos atribuídos por esta Lei não estão consignados na legislação específica. É o caso, por exemplo do IVA. Enquanto a Lei n.º 66/98 confere isenção do IVA às ONGD, remete para regulamentação por parte do Código do IVA que há muito tempo deixou de isentar as ONGD do pagamento de IVA.

Um dos principais benefícios que decorre do estatuto é a possibilidade de as ONGD acederem a fundos destinados a este tipo de organizações cujas regras de acesso, gestão e reporte são muito claras, apertadas e cumpridas sob o risco de se perder o financiamento e, ao limite, o estatuto.

 

FISCALIZAÇÃO DA ACÇÃO E FINANCIAMENTO DA ONGD

De acordo com as normas das entidades do sector não lucrativo, as ONGD são obrigadas a prestar contas interna e externamente. São sujeitas ainda a auditorias externas independentes exigidas pelos financiadores, públicos ou privados, nacionais ou estrangeiros e em caso de financiamento público nacional são ainda sujeitas a Auditoria do Tribunal de Contas . As ONGD são também obrigadas a prestar contas junto dos seus Associados (no caso das Associações e Cooperativas), Conselho Fiscal (em todos os casos, incluindo aquelas) e a tornar públicas as suas contas e demonstrações financeiras.

As ONGD portuguesas que, designadamente, trabalham em São Tomé e Príncipe com projectos financiados com fundos portugueses e da União Europeia têm os seus projectos auditados e a União Europeia fez mesmo recentemente uma monitoria aos projectos que financia neste país, processo que a Plataforma Portuguesa das ONGD considera da maior importância e que permite afirmar que estes projectos cumprem os mais controlados requisitos existentes a nível Europeu.

 

CONCLUSÃO

Não querendo desviar as atenções de casos alegadamente fraudulentos que deverão ter o tratamento policial e judicial que a lei impõe, importa não confundir “a floresta com apenas uma árvore”, pois muitas das ONGD portuguesas são, por exemplo a nível europeu, referência de Boas Práticas em vários âmbitos, sendo vários os seus projectos de relevo e com impacto comprovado.

A Plataforma Portuguesa das ONGD considera fundamentais os princípios da transparência e da prestação de contas, e neste sentido exige ainda às suas Associadas a publicação de relatórios de contas e narrativos, através dos quais as cidadãs e os cidadãos poderão aferir do impacto do trabalho dessas organizações.

Para que uma ONGD seja membro da Plataforma é-lhe exigida prova de cumprimento de vários requisitos mais exigentes que os critérios estabelecidos pela referida Lei n.º 66/98 para a atribuição do Estatuto de ONGD pelo Governo.

Neste momento, a Plataforma Portuguesa das ONGD encontra-se a desenvolver um Código de Ética e de Conduta que será aplicado às ONGD suas Associadas e que visa acima de tudo respeitar princípios e valores éticos considerados imperativos.

Assim e procurando de forma clara e inequívoca responder à pergunta a que os programas da RTP se propuseram a responder:

 

Não, as ONGD não são autênticos negócios disfarçados de obras de caridade pois a fiscalização pública e privada à sua constituição, funcionamento, financiamento e acção é profunda, constante, regular e efectiva.

É certo que é possível melhorar na comunicação, na transparência, na prestação de contas aos doadores particulares e até a Lei 66/98 de 14 de Outubro que regula as ONGD. Como em todos os sectores, poderá haver alguns casos pontuais de abusos. São, contudo, casos pontuais que não podem manchar a reputação de um sector que, de forma comprovada e documentada, tem tido um impacto tão positivo na vida de tantas pessoas.

 

Artigo 1.º, Ponto 2 do Regulamento Interno do Tribunal de Contas: “Estão sujeitas à jurisdição do Tribunal de Contas e aos seus poderes de controlo financeiro, nos termos da Constituição e da lei, todas as entidades do Sector Público, Administrativo e Empresarial, bem como as entidades de qualquer natureza que sejam beneficiárias de dinheiros ou outros valores públicos ou tenham participação de capitais públicos”.

Fonte: Plataforma Portuguesa das ONGD